Ainda bem que as pessoas não se importam com poetas.
Não os reconhecem pelas ruas em sua vigília,
em noites maldormidas e dias mal-acordados
abalados por confissões de glórias e pecados,
tomados de piedade pelas palavras exaustas de tanto explicar.
Ainda bem que os ignoram
testemunhando a paisagem que desaba sobre casas, igrejas,
anúncios de crédito fácil,
placas esquecidas de cabeça para baixo,
diante dos pássaros que repousam no canteiro
onde é Proibido Animais,
ou parados à porta de correr da lotérica que vende esperança.
Ainda bem que ninguém nota os poetas,
senão, deles se compadeceriam
assistindo-os agonizar sob o peso de amarguras tantas,
condenados a crer no ser humano,
debruçando seus corações sobre as coisas e suas verdades,
alvos da violência com que os humildes, pedantes,
carentes, inquietos e desavisados lhe tomam os pulsos
exigindo seus olhos.
Mas se os notassem os veriam como sequestradores
de imagens e palavras;
teriam ciúmes de seu êxtase
compartilhando as glórias humanas
como fragmentos aspergidos pelo mundo;
estes desocupados servem-se dos restos,
da insignificância
e não guardam o espanto;
são excêntricos que ninguém quer ter
(Será que falam de mim?).
Insanos poetas são riscos que não se deve correr,
Insinuando da vida, da morte,
emprestando as respostas que se preferia desconhecer,
revelando jardins ou sombras em que não se sabia estar,
contando toda a História do mundo em frases de uma sílaba só.
suspeito que ninguém mais se detenha em juízos,
suspeito que ninguém tenha dúvidas sobre a existência humana
suspeito que ignorem a sinceridade da entrelinha,
suspeito que, em vingança comezinha,
ninguém lerá esta poesia,
Pois, não é assim que a fariam.
Sérgio Flores de Campos. Livro Perplexos: Entre o Fundo e a Superfície.
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